"Com o sucesso de Ainda Estou Aqui, a ícone Fernanda Torres se torna Global."
"Aos 59 anos, Torres chama a atenção de Hollywood como uma potencial candidata à disputa da cobiçada estatueta dourada."
As frases acima saíram em duas das publicações mais importantes do mundo – respectivamente, a revista Vanity Fair e o jornal New York Times. A estrela é uma velha conhecida do público brasileiro: Fernanda Torres, um ícone da TV e do cinema desde os anos 1980.
Mas agora, aos 59, ela está no topo e no que parece ser o melhor momento de sua carreira. Fernanda foi indicada para disputar o prêmio de melhor atriz no Globo de Ouro, está nas listas das apostas do Oscar e também nas de melhores do ano de instituições importantes, como a Associação dos Críticos de Los Angeles.
A atriz parece, merecidamente, estar curtindo cada segundo. "Não acho que isso vai acontecer de novo na minha vida, então, vamos aproveitar”, disse, em entrevista à Vanity Fair.
O sucesso de Fernanda se deve à sua interpretação de Eunice Paiva, a heroína do sucesso de crítica e bilheteria Ainda Estou Aqui. Eunice é uma dona de casa e mãe de quatro filhos que precisa se reinventar e lutar a vida toda depois que seu marido, o engenheiro Rubens Paiva, "desaparece" nos porões da ditadura. A icônica Fernanda Montenegro, mãe de Torres, também aparece no filme, interpretando Eunice velha e com Alzheimer.
Não é todo dia que vemos duas atrizes brasileiras com esse sucesso internacional e no Brasil. E, para tornar tudo mais simbólico, isso acontece quando a mais nova tem 59 anos e a mais velha, 95.
Acompanhar Fernanda Torres vivendo seu melhor momento profissional aos 59 anos é um conforto e tanto para mulheres acima dos 50 anos, acostumadas a ouvir que "depois de certa idade o melhor já passou", e que "está chegando a hora de se aposentar". O fato de sua mãe brilhar ao seu lado aos 95 dá a esse sucesso um gosto ainda melhor. Se alguém tem dúvidas de que é possível ser ativa e genial até depois dos 90, Montenegro é nosso melhor exemplo.
Elas são ótimas inspirações. Isso porque é comum que com mais de 50 anos (ou mesmo antes) a gente pense que o melhor da vida profissional já passou. A sociedade joga isso na nossa cara tão intensamente que acabamos acreditando. E esse sentimento é baseado na realidade nua e crua. De acordo com uma pesquisa do site de busca de empregos Infojobs, 66% dos profissionais da geração X (nascidos entre meados da década de 1960 e 1979) já passaram por algum episódio de preconceito no trabalho devido à idade.
É totalmente sem sentido que profissionais mais experientes não sejam vistos como pessoas que sabem o que estão fazendo e capazes de acrescentar muito aos ambientes de trabalho justamente por terem experiência. Mas, infelizmente, ainda é o que acontece na maioria dos lugares.
Etarismo em Hollywood
Hollywood e o mundo do cinema e da TV em geral não são exceção, muito pelo contrário. É difícil, principalmente para mulheres, sobreviver ao tempo em uma indústria onde a aparência fresca e jovial das mulheres é supervalorizada. No caso dos homens, isso não acontece tanto, já que atores grisalhos, como George Clooney, 63, e Keanu Reeves, 60, são considerados símbolos sexuais que "ficam mais charmosos com a idade".
Segundo uma pesquisa do Instituto Geena Davis (da atriz de 68 anos, que também é ativista contra descriminação por gênero e idade), personagens com mais de 50 anos constituíram menos de um quarto de todos os filmes e programas de TV em Hollywood entre 2010 e 2020. Na faixa etária dos 50 anos, 80% dos atores dos filmes eram homens.
Esse cenário pode estar mudando? Talvez. O Globo de Ouro desse ano dá um ótimo sinal nessa direção: todas as indicadas são mulheres mais velhas. Entre elas, estão, além de Fernanda, Nicole Kidman, de 57 anos, e Demi Moore, de 62.
Em entrevista, Moore, que concorre por seu papel no filme A substância (um "filme de terror" sobre a busca fanática pela juventude eterna), afirmou que sofreu mais preconceito aos 40 do que aos 60. "Naquela época, ninguém sabia bem o que fazer comigo", disse.
Fernanda Torres não reclama desse tipo de preconceito e se diverte com o fato de que as gerações mais novas a conhecem por causa de memes com ela que circulam nas redes sociais.
"Eu sobrevivi com a geração mais jovem porque eu virei meme. Meus memes no Brasil eram como uma febre. Eu acho os memes uma forma superior de arte. Eu tenho muito orgulho", disse, em entrevista à Vanity Fair.
Sim, a febre Fernanda não está só nos meios cinematográficos. Ela é um fenômeno das redes. Em novembro, a página oficial da Academia do Oscar publicou uma foto da atriz como um dos destaques do ano. Resultado: até agora, 2,8 milhões de likes e comentários eufóricos. A febre Fernanda atinge todas as idades. E só temos o que comemorar com isso.
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Nina Lemos é jornalista e escritora. Escreve sobre feminismo e comportamento desde os anos 2000, quando lançou com duas amigas o grupo "02 Neurônio". Já foi colunista da Folha de S.Paulo e do UOL. É uma das criadoras da revista TPM. Em 2015, mudou para Berlim, cidade pela qual é loucamente apaixonada. Desde então, vive entre as notícias do Brasil e as aulas de alemão.
O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.